Passaram-se meses desde aquele dia fatídico da
apresentação, a minha irmã já estava bem pronta para recalcar os miolos do
Benji, o seu sarcasmo havia voltado mais poderoso do que nunca.
As férias de Natal foram bestiais, sempre com
bastante alegria, energia, sorrisos espelhados nos nossos rostos. Partilhámos a
felicidade, a gratidão, o amor, o carinho com todos os nossos amigos e
sobretudo com a pessoa que mais amava…
Foram duas semanas inesquecíveis, o entusiasmo que
estava presente no olhar de cada um, um novo brilho que impregnava o sorriso de
todos e fazia o coração bater ao ritmo desses sentimentos, um ritmo cálido que
nos aquecia com uma doce chama.
Acho que foi o melhor presente de Natal que me
deram… foi poder passar estes dias com os meus amigos, os meus verdadeiros
amigos, e também poder passar este Natal junto ao Toby, perdida no seu cálido
abraço, que me mantinha segura e quente e onde nada me atingia.
Haviam de ter visto o Oliver com um gorro de Pai
Natal de um vermelho carregado e com um pompom branco muito felpudo, tal como
todo o gorro. Ele estava em frente à PlayStation 3, agitando os braços, pulando
e fazendo tudo, o possível e o imaginário para que conseguisse ganhar aquele
jogo de dança, mas ele era mesmo um pé de chumbo, as suas acções era
ligeiramente fora do tempo, os seus passos eram desengonçados, houve uma vez
que jurei que ele ia cair, mas ele conseguiu equilibrar-se… foi hilariante, e
ele próprio se ria das suas palhaçadas, o Oliver era um grande amigo, sempre
cheio de energia e com um sorriso estampado no seu rosto que fazia com que
todos se sentissem bem.
O Toby cantou como um anjo, a sua voz doce e calma
impregnava os meus ouvidos numa delicada melodia, era ele que iluminava todas
as minhas noites escuras, era ele que me apoiava em tudo, era ele que me fazia
sorrir como jamais havia sorrido… ele era único e era meu.
Foi o Natal mais feliz de sempre…
Entretanto os meses foram passando, a escola ia
bastante bem, as aulas tornaram-se interessantes e apelativas, ganhei gosto em
estudar outra vez, aliás agora andava mais agarrada aos livros, como o Toby não
tinha muito tempo para estar comigo por causa do horário apertado dos treinos,
devido ao campeonato nacional que se aproximava e no qual eu esperava
ardentemente que a nossa equipa (equipa masculina) vencesse.
Estávamos no Verão, mas os rapazes continuam a
esforçar-se imenso nos treinos, o espírito vencedor deles era mesmo forte, a
sua coragem ultrapassava todos os limites e o seu empenho era maravilhoso,
tínhamos grandes oportunidades de vencer mais uma vez o campeonato.
Eu tenho ajudado o Toby com a escola, por vezes
faço-lhe os trabalhos de casa porque compreendo perfeitamente que ele não
possuí muito tempo, mesmo assim ele continua a ser um rapaz responsável sempre
atento nas aulas, e as notas que ele tem nos exames são sempre bastante altas e
pertencem-lhe, são os frutos do seu trabalho árduo.
Eu aproveitava também para apreciar e tentar
ajuda-lo a melhorar a sua técnica futebolística, na semana passada estive com
ele durante todo o Sábado no campo de futebol a treinar os remates, acho que
ele se estava a esforçar demasiado, ele já possuía uma técnica fantástica e um
dom notável para o futebol, mas mesmo assim insistia em melhorar cada vez mais.
A equipa feminina também continuava a ter os seus
treinos, mas nunca chegavam à brutal intensidade dos treinos da equipa
masculina, eles chegavam a casa estafados e não pensavam em fazer outra coisa
se não descansar.
Nós (equipa feminina do Nankatsu FC) não tínhamos
nenhum jogo agendado, mas já havíamos tido a oportunidade de defrontar equipas
bastante boas e fortes, o problema é que o futebol feminino no Japão ainda era
muito desvalorizado e algumas das equipas não tinham técnicas e tácticas tão
avançadas como a nossa e não contavam com jogadoras tão experientes como as do
Nankatsu FC. No torneio entre os colégios, a nossa equipa foi uma surpresa para
todos, ninguém estava à espera que a equipa feminina do Nankatsu jogasse tão bem.
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Estávamos precisamente a treinar, obedecendo às
ordens da nossa capitã, pois o nosso treinador ainda não tinha chegado.
Demos dez voltas ao campo a correr, sem parar,
depois decidimos que devíamos treinar os nossos remates e assim o fizemos. A
primeira a rematar era a Sanae, no preciso instante em que ela ergueu a sua
perna direita para executar o seu remate, uma voz rouca e grave clamou:
Meninas!
Ela parou de súbito quase perdendo o seu
equilíbrio. Nós ficámos preocupadas, será
que se tinha passado alguma coisa com os rapazes? Será que algum se teria
lesionado? Será que o Toby estava bem?! – O meu coração começava a
encher-se de receio e dúvidas.
O nosso treinador voltou a chamar por nós, ele
parecia estar ansioso, a sua respiração era irregular, bastante irregular,
pelos vistos devia ter vindo a correr e parecia que poderia explodir a qualquer
momento.
Ao observarmos aqueles olhos alarmados e aquela
voz entusiasmada corremos de imediato para perto do nosso treinador Hajime Ueki.,
formando uma espécie de círculo em torno dele.
Ele inspirou e expirou profundamente, fitou todas
nós com um olhar sério, opaco e distante, um olhar gélido, para de seguida
esboçar um sorriso e dizer com uma onda de felicidade e entusiasmo a
transparecer-lhe na voz: meninas, excelentes notícias. Vocês... Vão participar
no campeonato feminino de futebol nacional!
Quando os seus lábios pararam de se mover e quando
o meu cérebro e o meu corpo estagnaram para absorver aquela mensagem, eu
julguei que não tinha assimilado aquelas palavras correctamente. Fiquei
completamente petrificada de espanto.
Um sorriso desmesurado começava a aparecer nos
nossos rostos, a alegria era contagiante. Finalmente, íamos conseguir mostrar
os nossos dotes para o futebol a todo o país!
Era uma das melhores notícias que havia recebido,
já não era sem tempo, esta oportunidade que tínhamos agora á nossa frente de
elevar o futebol feminino a outro nível, ia ser bestial; naquele momento eu
percebi que todas nós sentíamos e pensávamos o mesmo: vencer o campeonato!
Assim poderíamos viajar em conjunto com a equipa
masculina, não teríamos de ficar sem as pessoas que amávamos por tempo
indeterminado.
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Estava ansiosa para contar as novidades ao Toby, o
meu coração aumentava o seu ritmo cardíaco só de pensar na sua reacção, o seu sorriso estampado no rosto, o brilho
incandescente do seu cálido olhar.
Estávamos mesmo a terminar o nosso treino, agora
jogávamos, havíamos sido divididas em duas partes equilibradas e em campo
confrontávamo-nos com diversos obstáculos; o cansaço era um deles. O meu corpo
não aguentava muito mais, não conseguia estabilizar a minha respiração nem o
ritmo dos meus batimentos cardíacos. O suor escorria pelo meu rosto em
abundantes quantidades; este treino foi o treino mais duro que eu já havia tido
em toda a minha vida, mas percebia o porquê de tanto esforço, o campeonato que
nos esperava ia ser árduo, iriamos precisar de toda a nossa força e garra para
vencer.
A minha visão estava um pouco distorcida mas
continuei a jogar, até que o nosso treinador disse finalizando o treino: Por
hoje acabou, esforçaram-se todas, estão de parabéns! – Um sorriso percorria o
seu rosto e o orgulho impregnava a sua voz.
Assim que a mensagem que o nosso treinador
proferiu irrompeu nos meus ouvidos, quase involuntariamente, o terreno
empoeirado e bastante rígido foi o meu amparo, precisava de descansar e não
tinha forças suficientes para me conseguir mover para o balneário, nem eu nem
quase ninguém da nossa equipa.
Agora que estava sentada e sem o meu corpo a
executar movimentos rápidos e fortes para rematar ou correr, tentava normalizar
a minha respiração que estava exaltada.
Fechei os olhos, a escuridão era agradável,
naquele momento apenas ouvia e sentia tudo à minha volta. O vento que
acariciava a minha pele era meigo e quente, mesmo com o sol refugiado por de
trás das montanhas, fora do alcance de todos, o calor que ele exercera durante
todo o dia havia ficado contido na atmosfera.
O ar quente que trespassava a minha pele e os meus
cabelos, aconchegava-me numa leve e doce brisa, permitindo que eu me
refrescasse um pouco.
No meu rosto permanecia um sorriso, uma sensação
de dever cumprido enchia o meu coração de alegria, fazendo com que este batesse
mais rápido.
Sabia que os treinos que iria ter daqui para a
frente iriam ser ainda mais exigentes, não me podia distrair, iria ser duro,
mas unidas íamos conseguir vencer o campeonato.
Um sorriso percorria todo o meu ser, enchendo-me
de felicidade e energia para continuar a trabalhar com o mesmo empenho e força
com que tinha trabalho até agora, esse sorriso também me fornecia a coragem para
ultrapassar todas as barreiras que íamos ter de enfrentar daqui para a frente.
A minha respiração já havia voltado ao normal, por
isso agora eu inspirava e expirava normalmente apreciando o precioso ar que
cobria os meus pulmões, parecia conseguir ouvir o bater do coração de todas
nós, pareciam estar sincronizados com o meu ritmo cardíaco, batiam todos ao
mesmo tempo… Era este o sentimento de uma equipa unida? Então era bestial, era
como se os nossos corações estivessem sintonizados na mesma frequência de
rádio… Era indescritível.
Aquele treino não tinha servido apenas para no pôr
em forma, mas sem criar uma ligação entre nós que era indispensável para a
nossa equipa.
- Rita… levanta-te, estiveste lindamente – os meus
olhos permaneciam fechados e eu já havia recuperado as minhas forças, apesar de
ainda sentir o suor espalhado por todo o meu corpo, sentia-me bem, satisfeita e
feliz comigo mesma.
Reconheci de imediato a voz que pedia que me
levantasse, era a nossa capitã, o motor da nossa equipa; uma boa amiga, sabia
que podia contar com ela para o resto da minha vida.
Abri lentamente os meus olhos e pude perceber que
ela estendia a sua mão, com um sorriso impresso no seu rosto, para me ajudar a
levantar. Dei-lhe a minha mão ainda um pouco fraca mas feliz, impulsionei o meu
corpo para cima e ela puxou-me também com a força que ainda lhe restava.
Ergui-me com a sua ajuda e quando encontrei de
novo a minha posição de equilíbrio ela desviou a sua mão da minha para colocar,
logo de seguida, o seu braço sobre os meus ombros, felicitando-me de novo.
De repente vi todas a caminharem na minha direcção
com um sorriso nos lábios, mas o que se
tinha passado para todas estarem a olhar para mim e a sorrir? O que é que eu tinha feito de tão especial
para isto estar a acontecer?
Estava feliz, mas agora um pouco confusa, atónita,
espantada, quase perplexa, eu diria chocada, qual seria o motivo de tanta
felicitação? A curiosidade e também a expectativa começavam a preencher o meu
corpo.
- Wow, foste fantástica, de todas nós foste a que
se esforçou mais neste treino – afirmou a Patrícia com um sorriso também a
inundar o seu olhar, e todas as outras concordaram acenando afirmativamente com
a cabeça, e com os olhos cintilando. Ficava feliz, mas não me havia apercebido
de tal coisa, estava tão concentrada nos nossos corações sincronizados, nos
nossos passes bem-sucedidos e remates imparáveis que nem reparei que tinha tido
o papel principal neste treino… Mesmo assim, éramos uma equipa, e o esforço de
um pertencia a todas.
- Obrigada meninas… mas não se esqueçam, somos uma
equipa e no fim a recompensa é de todas – Fiz sinal para que se juntassem todas
à minha volta, com os braços apoiados nos ombros das colegas do lado, como se estivéssemos
a discutir a táctica que usaríamos ou a estratégia que iriamos utilizar num
jogo.
Olhei para a Sanae com uma pergunta no olhar, há
muito tempo que esperava ter a oportunidade de dizer algo com todas as minhas
forças, com toda a minha alma, todo o meu coração; ela respondeu de seguida com
um sorriso e acenando afirmativamente com a cabeça, num movimento rápido de
impulsivo.
- Ok, meninas… VAMOS VENCER ESTE CAMPEONATO! – Há bastante
tempo que queria proferir aquelas palavras com toda a garra e força na minha
voz, mas a capitã é que tinha esse dever, e estava a cumpri-lo lindamente, mas
desta vez queria ser eu a proferir o nosso grito de guerra.
- SIM! – responderam todas, com um sorriso
espelhado nos olhos, que cintilavam de alegria.
Assim que finalizámos o nosso grito de guerra cujo
tinha sido iniciado por mim, os meus ouvidos inundaram-se com um som seco, rápido,
ritmado e forte, era o som dos aplausos com que éramos brindadas; dos rapazes
que estava, nas bancadas em conjunto com o nosso treinador que estava bastante
feliz, orgulhoso e motivado como nós.
Estávamos tão absorvidas na nossa ideia de vencer
o campeonato que nem sequer nos apercebíamos das coisas que aconteciam à nossa
volta.
Pelos vistos os rapazes já tinham finalizado o seu
treino e vieram para assistir ao nosso, não pude evitar, um sorriso quase
deslumbrante apareceu no meu rosto ao ouvir a sua voz, e ao sentir o sue olhar
cintilante pousado em mim. A felicidade de vê-lo a apoiar-me e o sentimento
imenso que ainda permanecia no meu corpo depois daquele treino juntavam-se,
levando o meu coração ao mais rápido dos batimentos. Estava tão feliz nem
sequer tinha palavras para descrever o que sentia.
Já não via a
altura de sentir os seus braços fortes a envolverem-me num doce abraço, os seus
lábios cálidos a acariciarem os meus, o seu perfume adocicado, o seu olhar
meigo e recheado de brilho cristalino e puro…
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Brito
Créditos: Rita Misaki
Escrito por: Rita Misaki
História Criada por: Rita Misaki e Patrícia Wakabayashi